Estávamos em Novembro de 2017. A Associação dos Vendedores Ambulantes de Luanda (AVAL), que reúne quase 4.000 ‘zungueiras’, alertava que a actividade, que está a ser travada pelo governo provincial, era (e continua a ser) o único sustento de milhares de famílias, que necessitam de “soluções de emprego”.
“A nossa associação não concorda que se possa acabar com a venda ambulante porque o país não tem emprego e o que cria a venda ambulante é o problema do desemprego no país”, começou por explicar, em entrevista à Lusa, o presidente da AVAL, José Cassoma.
Aquele dirigente reagia à polémica instalada na capital angolana, depois da orientação do novo governador provincial de Luanda, Adriano Mendes de Carvalho, para “o fim urgente da venda ambulante nas ruas, avenidas e zonas pedonais da capital angolana”.
“Queremos e defendemos a organização da venda ambulante, porque nesta altura achamos que os vendedores ambulantes deveriam contribuir também para os cofres do Estado, uma vez que o país se encontra numa situação económica difícil”, afirmou por seu turno o presidente da AVAL.
Uma organização que, refere, pode “passar por atribuição de cartões de ambulante” ao nível dos nove municípios de Luanda, “no sentido de o Estado daí poder obter recursos para o Orçamento Geral do Estado”, de resto, recorda, “como já se fazia anteriormente”.
“Se houvesse uma boa organização e fiscalização poderia funcionar, porque temos países lá fora em que a venda ambulante existe. Agora num país com sérios problemas sociais e económicos, sem emprego para juventude, apenas encontram sustento aí para as suas famílias”, explicou.
Adriano Mendes de Carvalho ordenou, no final de Outubro de 2017, o fim desta actividade, classificando como “inadmissível” a situação que se vem registando nos últimos dias, “sob olhar impávido dos administradores”.
A medida é encarada com bastante preocupação no seio das vendedoras ambulantes de Luanda, também conhecidas como ‘zungueiras’, por ser o único sustento que têm.
Depois desta orientação, as equipas de fiscalização, segundo os relatos da altura, têm vindo a actuar em força nos arredores da capital, nomeadamente com a apreensão do “negócio” que por norma estas mulheres, mas também muitos homens mais novos, carregam pelas ruas de Luanda, a vender.
Para José Cassoma, terminar com esta venda ambulante na capital angolana “deve acontecer apenas com apresentação de soluções de emprego” por parte do governo da província, por se tratar de uma forma de “sobrevivência” e que “apenas lutam para sustentar as famílias”.
Com 3.700 vendedores cadastrados, o presidente da associação, que existe desde 2013, refutou ainda as informações de mercados vazios, em que os vendedores ambulantes se recusam frequentar, considerando que deveriam previamente consultar esses vendedores.
“Constroem-se os mercados sem antes consultar os vendedores e ainda há um hábito de as pessoas comprarem em locais mais próximos, porque nos mercados distantes o vendedor vai e há clientes”, apontou.
Questionado sobre as motivações dos vendedores que optam por fazer o negócio em passeios e pedonais, conforme referiu igualmente o governador da capital, o presidente da AVAL assumiu discordar dessas práticas.
“Não concordo com as vendas nos passeios e pedonais, mas concordo que haja lugares indicados pelas autoridades. Daí que falamos em organização, sobretudo a nível dos municípios, porque daí pode haver orientações das vendas serem intermunicipais, em função do cadastro de cartões”, explicou.
A venda ambulante há muito que é condenada pelas autoridades, por nomeadamente condicionar o trânsito, contudo tem sido agravada pela crise económica e financeira que Angola vive, como última forma de sustento para milhares de famílias.
O Governo anunciou no passado dia 17 que o Regulamento sobre o Comércio Ambulante está pronto e que, até ao final do ano, os vendedores ambulantes no país estarão identificados e terão locais específicos para exercerem a actividade “à luz das normas”.
Segundo o ministro do Comércio, Joffre Van-Dúnem Júnior, o regulamento aprovado pelo Governo vai formalizar o comércio, maioritariamente, exercido por jovens e mulheres, estas conhecidas como zungueiras.
“Foi já aprovado pelo Conselho de Ministros o Regulamento do Comércio Ambulante. Estão já catalogados e identificados os locais para se poder exercer a actividade, depois de uma análise com as autoridades provinciais”, afirmou.
Joffre Van-Dúnem Júnior admitiu que um dos objectivos da medida é apoiar as condições para “trazer o mercado informal para o formal”.
O Regulamento, adiantou o governante, também especifica quais os produtos que não são passíveis de serem comercializados no comércio ambulante, como combustíveis e medicamentos, entre outros.
“Podemos ficar sossegados que, até ao final do ano, seguramente, os vendedores ambulantes serão identificados, terão o seu cartão e locais onde poderão exercer a sua actividade”, concluiu.
A forte presença de mulheres na economia informal de Angola, consequência da luta pela sobrevivência e não apenas, como foi e é a versão do regime, pelo seu baixo nível de escolaridade, é um dos principais desafios a ultrapassar para a integração feminina no sector produtivo.
Legenda: Zungueira morreu atropelada quando fugia à Polícia (foto de arquivo)
Folha 8 com Lusa